sexta-feira, 19 de junho de 2009

Desatrofiando as asas

Levantei sem me preocupar com a hora. Fiz uma xícara de café, acendi um cigarro e sentei na janela do meu quarto, com as pernas cruzadas, olhando as pessoas andarem lá embaixo. Tão preocupadas! Eu não tinha preocupação nenhuma, a não ser a determinação de não me preocupar com nada, por pelo menos um dia.
Passei os dedos no cabelo, coloquei um cachecol, tirei o chinelo e pulei. A queda livre é como um grito surdo. O vento terminou de pentear meus cabelos e soprava em meus ouvidos. Antes que eu chegasse ao chão elas se abriram. Eu sabia que elas não tinham me abandonado, mesmo tão renegadas e atrofiadas elas ainda estavam lá. Voltei para o alto e voei sem rumo. Como ainda estavam fracas elas não aguentariam ir muito longe. Fui para o lugar mais alto que encontrei e me sentei. Queria aproveitar aquele momento, respirar profundamente e deixar cada momento registrado como uma fotografia. Era como se resgatasse uma sensação que estava perdida no passado e deixada apenas à lembrança. Chorei como uma criança, mas não sentia medo nem estava triste. Era intenso e eu precisava dividir aquilo com o mundo de alguma forma. "Tão grande que não caibo em mim", eu costumo escrever sobre essa sensação mas nunca soube explicar direito o que quero dizer com isso. Grande, mas de tão pequena não caibo em mim. Algumas vezes, quando vou dormir, tenho a sensação que ultrapasso a barreira da minha matéria e saio de mim. Não como uma alma saindo do corpo, mas extrapolando as barreiras e sendo maior que ele, como um contorno que é necessário para completar o desenho de quem eu sou: um amontoado que não cabe aqui dentro. É difícil pegar no sono nessas ocasiões. Fico com medo que o contorno se torne definitivo e visível para todos. Será que os outros também sentem isso e escondem seus contornos?
Uma música que eu nunca tinha escutado não me saia da cabeça, em inglês ela repetia um refrão com alguma coisa parecida com : "Last chance". Eu a ignorei. Não queria me preocupar, lembra?
Eu não percebi o tempo passar e já havia escurecido. Elas começaram a me puxar e eu sabia que precisava voltar. Deixei que elas fizessem o caminho. Eu tinha duas asas gigantes e coloridas. Quando botei os pés no meu quarto, elas se desfizeram. Centenas de borboletas estavam ao meu redor. Uma a uma, elas foram caindo. Uma a uma, elas se foram. Dizem que borboletas vivem apenas 24 horas. Elas viveram menos, mas pareciam realizadas. Então eu me dei conta que não mato mais borboletas, principalmente as do meu estômago. E todos os dias elas estão lá novamente.
Na outra manhã, acordei com uma revoada colorida me convidando para outro passeio.



Acho que está na hora de mudar o nome do blog.

PS.: Meu desafio insano foi uma farsa, não tive tempo nem disposição para colocá-lo em prática. Peço desculpas pelas expectativas criadas, se é que elas se criaram. Prometo ser mais confiável no próximo desafio (ou não). Melhor, prefiro pensar 10 vezes antes de propor um desafio.